Governança Familiar – Pilares de Perpetuação do Legado: O Protocolo de Família
- Pádua Faria Advogados
- 6 de jun.
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Pesquisas indicam que entre as empresas familiares no Brasil somente uma parcela muito pequena (entre 3% e 4%) consegue alcançar a terceira geração. Esse dado alarmante demonstra que a capacidade de perpetuação desse tipo de negócios é comprometida por diversos desafios e fragilidades vividos no contexto de negócios que nascem e se desenvolvem a partir de um núcleo familiar.
Quando falamos da importância da adoção de ferramentas e sistemas de governança corporativa, aquele conjunto de regras e princípios que busca ordenar a gestão de uma empresa visando à geração de valor, esses dados econômicos da realidade do mercado brasileiro, anualmente apurados em pesquisas, deixam claro o quanto este tema não pode ser negligenciado, mas merece estar em primeiro plano nas discussões de famílias empresárias que desejam construir um legado que resista às provações do tempo e atravesse gerações.
É comum encontrar em negócios familiares um grau acentuado de informalidade, marcado por ausência de processos e regras claras, falta de instrumentos formalizados que garantam segurança jurídica e o desempenho de funções de gestão que se confundem em razão dos vínculos afetivos e das relações de parentesco. Todos esses elementos, com o passar do tempo, tendem a criar a receita perfeita para conflitos, crises e, nos piores casos, o colapso da empresa.
Entretanto, o caminho que conduz ao processo de profissionalização e à governança corporativa nem sempre é claro e cada empresa e família deve iniciar este processo, que passa por diferentes fases, de uma forma única, levando em conta sua realidade e necessidades.
Para ajudar nesse processo, um ótimo ponto de partida é a elaboração de um Protocolo de Família.
Na definição do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa), o Protocolo de Família é um acordo celebrado entre todos os membros de uma família com o objetivo de traduzir para um documento os valores, princípios e objetivos que compõe a história e a identidade daquele núcleo familiar.
Na prática, funciona como um código, descrevendo os elementos caracterizadores da família e servindo também como guia norteador das decisões familiares, prescrevendo regras, metas e orientações sobre temas diversos.
Dessa forma, trata-se de um passo inicial na construção de um sistema de governança, mas essencial para promover o diálogo e a comunicação entre diferentes gerações, buscando uma base comum a partir da qual cada familiar poderá nortear a própria trajetória, garantindo o sentimento de unidade e pertencimento de todos como partes de algo maior e valioso.
A adoção de um Protocolo de Família pode-se apresentar como uma oportunidade para estabelecer critérios e objetivos antes da adoção de instrumentos mais sofisticados e de caráter mais institucional como, por exemplo, órgãos colegiados, tais como conselhos de administração e fiscal, celebração de acordos de sócios, entre outras estruturas.
Nessa linha, o Protocolo de Família, enquanto instrumento de governança, funciona como uma ferramenta de transição, o primeiro degrau de uma escada que leva, paulatinamente, a um nível mais elevado de governança corporativa.
É importante frisar que, embora não possua valor jurídico reconhecido em nosso ordenamento, o Protocolo de Família é ferramenta valiosa na medida em que formaliza, entre todos os que dele participam, princípios e valores, devendo prever normas de conduta para a família empresária. Assim, funciona como um verdadeiro pacto, uma aliança entre gerações, zelando pelas relações familiares e orientando os diversos interesses de cada membro a partir de uma história familiar comum.
Dentre diversos temas e assuntos que podem ser contemplados neste verdadeiro código familiar, podemos elencar:
A importante definição de quem será considerado membro da família empresária;
Regras para ingresso e atuação de familiares na empresa;
Planos de formação e capacitação de sucessores;
Regras para o uso privado de bens (móveis e imóveis) e recursos da empresa por membros da família;
Previsão de criação de fóruns específicos para fomentar o diálogo e a comunicação, como o conselho de família;
Políticas de investimento e novos negócios;
Planejamento patrimonial e sucessório;
Mecanismos de solução de conflitos;
Orientações acerca de uniões estáveis, casamentos, escolha do regime de bens, e instrumentos correlatos.
Famílias empresárias que adotam Protocolo de Família revelaram, em pesquisa conduzida pelo IBGC, que a elaboração do documento promoveu o fortalecimento dos princípios orientadores da família, o amadurecimento dos membros a partir das discussões, reflexões sobre expectativas e planos futuros, além de trazer mais clareza sobre os papéis desempenhados por cada membro.
Para além disso, este pacto intergeracional é, e sempre deve ser, um documento vivo e, portanto, deve passar por atualizações e ajustes constantes, de forma a permanecer contemporâneo, acompanhando as mudanças na composição e realidade familiar.
O Protocolo de Família oferece uma oportunidade verdadeiramente enriquecedora para o início de um processo de profissionalização e criação de um sistema de governança único e personalizado. Propicia o diálogo entre gerações, valorizando a transparência, o compartilhamento de valores, princípios e metas, com o objetivo de estabelecer uma base comum e sólida para a construção de um legado coletivo, familiar, em que prevalecem a confiança e a segurança proporcionados por uma história e identidade comuns, ao mesmo tempo em que estabelece a mesma visão de futuro para o legado a ser perpetuado.
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