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Bianca Alves e Djonatha Oliveira

Gravação indevida durante o voo e suas implicações cíveis

Aspectos introdutórios quanto ao direito de imagem




O direito de imagem é reconhecido pela Constituição Federal de 1988 como um direito fundamental.

O artigo 5º, inciso X, assegura a inviolabilidade da imagem, bem como a possibilidade de indenização por danos morais ou materiais em caso de sua violação. Complementando esse entendimento, o Código Civil dispõe, em seu artigo 20, que a utilização da imagem de uma pessoa sem o devido consentimento ou fora de situações específicas previstas em lei, como a administração da justiça ou a manutenção da ordem pública, é passível de proibição e reparação.

Em tempos de ampla disseminação de conteúdos pela internet, a proteção do direito de imagem ganha ainda mais relevância. Casos emblemáticos, como a gravação de uma passageira sem consentimento em um voo, demonstram os desafios dessa tutela no ambiente digital. A divulgação de imagens sem autorização, ainda que sem tom humilhante, fere a privacidade e a dignidade da pessoa exposta, acarretando responsabilização civil.



Da proteção do direito de imagem


O direito de imagem é tido como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

[...]


Portanto, a imagem é um direito inviolável e apenas pode ser publicada ou divulgada quando expressamente autorizada pelo titular ou necessária à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, nos termos do art. 20, caput, do Código Civil:

Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.


Sobre o tema, leciona Bruno Miragem:


Com relação ao direito à imagem, em regra, refere a doutrina sobre a necessidade de consentimento do titular do direito. Mas a questão é definir se a exposição sem o consentimento, ainda que presumida, ofende o direito subjetivo de imagem.

A definição triunfante, entretanto é a da autonomia do direito subjetivo à imagem, tendo por pressuposto que o sujeito é proprietário dele mesmo, assim como de seu físico, cuja reprodução não consentida enseja per se a pretensão à reparação. Da mesma forma, a proteção à reprodução da imagem de si mesmo tem como consequência a proteção de outros direitos da personalidade. A expressão de significados através da imagem gráfica é uma das características dos modernos meios de comunicação. Assim, por exemplo, o fato da publicação de uma fotografia não autorizada da pessoa, ao tempo em que fere por si o seu direito à imagem, da mesma forma poderá violar, peia informação que transmite sobre fatos, outros direitos da pessoa como à proteção da sua honra ou o respeito à vida privada, bem como violação à proteção legal endereçada ao vulnerável (Responsabilidade Civil da Imprensa por Dano à Honra, Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2005, pág. 133)


Acerca da publicação de imagem sem prévia autorização do titular, manifestaram-se os Tribunais:


Apelação - Ação de indenização por danos morais – Direito de imagem – Sentença de procedência – Insurgência da ré – Não cabimento - Direito à imagem que corresponde à identificação e individualização (art. 5º, V e X, da CF) - Uso indevido ou não autorizado da imagem, ainda que não cause dano material, resultará em dano moral pelo simples fato da publicação ou revelação da imagem não autorizada (art. 20, do CC) – [...] – Dano moral caracterizado, por violação do direito de imagem -Indenização mantida – Honorários advocatícios majorados, nos termos do art. 85, § 11º do CPC - Recurso improvido. (TJSP. Apelação Cível nº 1004057-74.2019.8.26.0003. 2ª Câmara de Direito Privado. Relatora: HERTHA HELENA DE OLIVEIRA. Julgamento: 18/03/2021. Publicação: 25/03/2021) (Grifos nossos)


E ainda:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - USO INDEVIDO DE NOME, REGISTRO PROFISSIONAL E IMAGEM DO AUTOR – DANO MORAL PRESUMIDO - QUANTUM INDENIZATÓRIO - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. A imagem é inviolável (art. 5º, X, da CF) e a sua utilização sem o consentimento do titular do direito é suficiente para gerar o direito à indenização, pois decorre da própria violação de tal direito, sendo o dano presumido. A indenização por dano moral deve ser arbitrada segundo o prudente arbítrio do julgador, sempre com moderação, observando-se as peculiaridades do caso concreto e os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de modo que o quantum arbitrado se preste a atender ao caráter punitivo da medida e de recomposição dos prejuízos, sem importar, contudo, enriquecimento sem causa da vítima. (TJMG. Apelação Cível 1.0000.22.254292-0/001 5001109-17.2021.8.13.0607. Relator: Des.(a) José de Carvalho Barbosa. Julgamento: 02/03/2023. Publicação: 03/03/2023) (Grifo nosso)


Observa-se que o direito à imagem é assegurado como direito fundamental pela Constituição Federal de 1988, garantindo indenização por danos decorrentes de sua violação. Na esfera infraconstitucional, essa proteção também está prevista no Código Civil, que determina a proibição da utilização não autorizada da imagem e prevê reparação em caso de lesão à honra, boa fama ou uso comercial indevido. Esse arcabouço normativo reforça a autonomia do direito à imagem, reconhecendo-o como elemento central da dignidade humana.

A jurisprudência consolida a ideia de que a publicação não autorizada de imagens, ainda que sem caráter depreciativo, é lesiva e passível de responsabilização, reafirmando a autonomia desse direito no ordenamento jurídico brasileiro.

Além disso, a proteção à imagem está intimamente ligada à tutela de outros direitos da personalidade, como a honra e a privacidade, conferindo ampla defesa à integridade moral do indivíduo. No cenário digital, essa proteção se torna ainda mais relevante, dada a velocidade e o alcance da disseminação de informações, exigindo constante vigilância e aplicação criteriosa das normas existentes. Assim, o direito à imagem não se limita à proteção da identidade visual, mas também reflete a busca pelo equilíbrio entre liberdade de expressão e respeito aos valores fundamentais da convivência social.


Sobre o caso da passageira gravada em voo por não ceder seu assento e do direito de indenização

No mês de dezembro de 2024, durante um voo, uma passageira foi filmada sem autorização ao se recusar a ceder seu assento na janela para uma criança. O vídeo, compartilhado nas redes sociais, provocou grande repercussão.


Na gravação, uma mulher expressa críticas a outra passageira por não ter cedido seu assento para o filho dela, que chorava durante o voo, afirmando: “Essa pessoa tem algum problema? Porque se tiver, a gente até entende, mas é muita falta de empatia. É uma criança!”.

Durante o incidente, a jovem não demonstrou nenhuma reação, mas a publicação de sua imagem nas redes sociais, sem seu consentimento, gerou grande repercussão. O caso foi amplamente discutido pelos internautas, com alguns apoiando a postura da jovem e outros defendendo a mãe da criança.


No caso apresentado, a exposição indevida da passageira nas redes sociais, mesmo sem intenção depreciativa, configura violação do direito subjetivo à imagem.


Embora a gravação não tenha um tom humilhante, a simples ausência de consentimento configura uma violação, como previsto no artigo 20 do Código Civil. Essa divulgação, que alcançou grande audiência nas redes sociais, afetou diretamente a dignidade e a privacidade da passageira, abrindo margem para responsabilização civil contra quem divulgou o conteúdo. A doutrina e a jurisprudência corroboram que o dano moral é presumido pela exposição não autorizada, sendo a reparação determinada com base na razoabilidade e na proporcionalidade do impacto causado.


Assim, o episódio reforça a necessidade de maior conscientização sobre o uso de imagens alheias e os limites impostos pela legislação, especialmente em tempos de rápida disseminação de conteúdos pela internet. A proteção do direito à imagem é essencial para resguardar a dignidade humana e evitar que situações cotidianas resultem em violações graves.


Referências:

ACS. Direito de Imagem. Disponível em: <https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-semanal/direito-de-imagem>. Acesso em: 09 dez. 2024.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2016]. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 09 dez. 2024.

MIGALHAS. Gravação indevida em voo pode gerar processo criminal, dizem advogados. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/quentes/421135/gravacao-indevida-em-voo-pode-gerar-processo-criminal-dizem-advogados>. Acesso em: 9 dez. 2024

MIRAGEM, Bruno. Responsabilidade Civil da Imprensa por Dano à Honra. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2005.

Polêmica no avião: entenda o caso da mulher que viralizou ao ser exposta por não ceder lugar para criança. Disponível em: <https://g1.globo.com/turismo-e-viagem/noticia/2024/12/06/polemica-no-aviao-entenda-o-caso-da-mulher-que-viralizou-ao- nao-ceder-lugar-para-crianca.ghtml>. Acesso em: 9 dez. 2024.

Viral após negar assento à criança em voo, Jennifer Castro cresce nas redes e fecha nova publicidade. Disponível em: <https://exame.com/marketing/viral-apos-negar-assento-a-crianca-em-voo-jennifer-castro-cresce-nas-redes-e-fecha-nova-publicidade/>. Acesso em: 9 dez. 2024.

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