Imagine a seguinte situação hipotética: Em uma gleba de terras, há o loteamento regular de uma porção de lotes. Entretanto, no momento da infraestrutura, o particular loteador, mancomunado com o agente público, impõe, indevidamente, o custeio de determinada obra do loteamento ao município. O ato mencionado gera benefício direto dos particulares, inclusive do agente público, que é um dos beneficiários do loteamento, e gastos indevidos para a municipalidade.
Ambos são descobertos e o MP ajuíza a ação de improbidade.
Ao longo da Ação de Ressarcimento ao erário por atos de improbidade administrativa proposta pelo MP, além da condenação em pecúnia, houve o questionamento pelos acusados sobre a possibilidade de condenação em (i) suspensão dos direitos políticos e (ii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, para os dois réus, o agente público e para o particular loteador.
A grande pergunta é: Por que o particular perderia o direito de votar e ser votado e o Agente Público o de contratar com a Administração ou receber benefício fiscal? O particular não precisa ser votado e o Agente Público não é empresário!
O Superior Tribunal de Justiça entendeu, no REsp 1.735.603/AL, que é possível a condenação do particular e do agente público em ambas as sanções, embora cada uma seja mais afeta a cada um.
Os Ministros entenderam que: “ainda que a sanção não produzisse efeito na capacidade de serem votados (ius honorum) ou de perderem mandatos, impactaria, no mínimo, na possibilidade daqueles (particulares) de exercer o direito de voto (ius suffragii)” e “embora os agentes públicos, na época da decisão, não desempenhassem a atividade empresarial, nada impediria que, se não fossem os efeitos da sanção, passassem a desempenhar tal atividade [empresarial] no futuro”.
A discussão não é pacífica no Tribunal. Existem aqueles que as punições devem ser adequadas para cada réu e não genéricas, de modo a não violar o princípio da individualização da pena, afeta ao Direito Administrativo Sancionador.
Há ainda de se visualizar a presença do dolo específico de caso a caso, isso é, a vontade, tanto do agente público quanto do particular, de lesar a municipalidade, sem a qual não é possível aplicação das penas da Lei de Improbidade Administrativa, inclusive aos processos que ainda estão em curso (REsp 2.107.601/MG).
É bom lembrar como disse Salomão: “O rei justo sustém a terra, mas o amigo de impostos a transtorna”.
Álick Henrique Souza Eduardo - Advogado, com ênfase em Direito Cível e Empresarial, no escritório Pádua Faria Advogados. Mestrando em Direito pela UNESP/Franca.
E-mail: alick@paduafariaadvogados.com.br
Fonte: Informativo de Jurisprudência n. 824 - 10 de setembro de 2024. Improbidade administrativa. Sanções. Suspensão dos direitos políticos e proibição de contratar com o poder público. Aplicação aos agentes públicos e aos particulares. Possibilidade.
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