Transação Tributária: mais atratividade com uso ampliado de prejuízo fiscal, mas a revisão da Capag segue como obstáculo estratégico
- Ana Beatriz Sampaio
- 6 de jun.
- 3 min de leitura

Nos últimos meses, a PGFN e a Receita Federal têm dado sinais claros de que pretendem incentivar a adesão de grandes empresas ao Programa de Transação Integral (PTI), lançado em dezembro passado. O PTI é uma modalidade de transação tributária voltada exclusivamente para contribuintes com débitos inscritos em dívida ativa que discutem judicialmente teses tributárias relevantes e controversas. A proposta do programa é permitir que essas empresas regularizem seus passivos mediante concessões recíprocas — como descontos, parcelamentos e uso de créditos fiscais —, encerrando litígios e promovendo a arrecadação com segurança jurídica. Uma das principais medidas anunciadas para tornar o programa mais atrativo foi a ampliação do limite para uso de prejuízo fiscal e base negativa da CSLL na amortização da dívida tributária: o teto, que antes era de 10% do valor remanescente após descontos, agora passou para 30%.
A mudança, bastante positiva, atende a uma demanda recorrente das empresas que apuram IRPJ e CSLL pelo regime do lucro real. Ao permitir maior aproveitamento dos prejuízos acumulados, o programa se torna significativamente mais atrativo do ponto de vista econômico, reduzindo a necessidade de desembolso imediato de caixa.
Ocorre que, apesar da melhora nas condições financeiras do programa, a adesão ao PTI ainda exige cautela. Isso porque o contribuinte que pretende aderir deve estar ciente de que a PGFN atribui a cada empresa uma nota de capacidade de pagamento (Capag), que é um dos principais fatores para definir o percentual de desconto concedido na transação. Quanto menor a Capag atribuída à empresa — ou seja, quanto mais limitada for sua capacidade de pagamento —, maior tende a ser o desconto oferecido sobre multas, juros e encargos legais. Por isso, é fundamental que a nota reflita com precisão a real situação econômico-financeira da empresa. No entanto, nem sempre isso acontece, o que torna estratégica a apresentação de pedido de revisão da Capag, especialmente quando se identifica alguma inconsistência nos dados utilizados pela PGFN ou quando a empresa deseja apresentar uma estimativa própria com base nos critérios previstos na Portaria PGFN nº 6.757/2022.
Essa revisão deve ser requerida no prazo de 30 dias a contar da ciência da classificação atribuída. O pedido precisa ser instruído com um laudo técnico de profissional habilitado (geralmente contador), balanços patrimoniais, DREs, demonstrações de fluxo de caixa, relação de bens, extratos bancários e outros documentos exigidos pela norma.
Mesmo com todos esses documentos, na prática, o indeferimento desses pedidos tem sido frequente. E aqui reside um ponto delicado: embora o contribuinte possa tentar levar a questão ao Judiciário por meio de mandado de segurança, a jurisprudência dominante – inclusive em Tribunais tradicionalmente pró-contribuinte, como o TRF-4 – tem entendido que não há direito líquido e certo à reclassificação da Capag.
Ou seja: muitas empresas se deparam com a seguinte situação paradoxal – têm interesse em transacionar, possuem créditos de prejuízo fiscal para usar, mas recebem uma nota Capag incompatível com sua realidade e não conseguem reverter isso nem administrativa nem judicialmente.
Essa limitação esvazia parcialmente os avanços promovidos pelo programa. Afinal, a atratividade do PTI está diretamente ligada à viabilidade de obtenção de condições favoráveis — e isso depende, sobretudo, da classificação da capacidade de pagamento.
Portanto, embora o aumento do percentual de utilização de prejuízo fiscal represente um avanço real, é preciso reconhecer que a efetividade do PTI ainda depende da superação de barreiras técnicas e burocráticas que vão além da adesão em si.
É fundamental que empresas e seus assessores tributários estejam atentos ao prazo para revisão da Capag, elaborem pedidos bem fundamentados e avaliem criteriosamente o custo-benefício da transação — levando em conta não só o mérito da tese tributária envolvida, mas também o grau de êxito provável de uma eventual judicialização futura.
Texto elaborado pela advogada tributarista do Pádua Faria Advogados, Ana Beatriz Sampaio.
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