Governança Familiar – Pilares de Perpetuação do Legado: O Conselho de Família
- Maria Fernanda Penedo
- 14 de ago.
- 4 min de leitura

Dando continuidade às reflexões sobre a governança corporativa aplicada a empresas familiares, tratamos, nesta oportunidade, de outra ferramenta proposta por este conjunto de boas práticas: o Conselho de Família.
Para contextualizar o objeto desta análise, lançamos mão, mais uma vez, do já emblemático modelo das três esferas, ilustração consagrada e inescapável quando o assunto é governança familiar.
Nele, são representados os três aspectos primordiais das empresas familiares: a esfera da família, a esfera da gestão da empresa e a esfera da propriedade.
Com o objetivo de tornar as relações e processos inerentes aos negócios familiares mais organizados, eficientes e hígidos, a governança corporativa de empresas familiares propõe dissociar assuntos de naturezas distintas, justamente para que certas questões ou problemas não influenciem ou até mesmo “contaminem” a empresa e vice-versa.
Desta forma, assuntos familiares e empresariais são tratados em espaços (órgãos) diferentes, de acordo com as suas naturezas, para que não haja uma “sobreposição” de uma esfera sobre a outra.
A adoção de Conselhos de Administração, Consultivo, Conselho de Família (ou Assembleia Familiar, para famílias menores e com constituição menos complexa), entre outros, busca criar uma organização mais harmônica e eficiente das partes (esferas) de forma a beneficiar o todo.
Temos, assim, que o Conselho de Família é um órgão que terá por finalidade cuidar dos assuntos diretamente ligados ao núcleo familiar, promovendo a transparência e a comunicação entre os membros e atuando, também, como um canal para dialogar com os órgãos da empresa (Conselho de Administração ou Consultivo, conforme o caso).
Como se vê, o Conselho de Família pode desempenhar um papel essencial e até mesmo estratégico nas empresas familiares.
Essencial porque servirá como o fórum mais adequado paras as discussões familiares, garantindo um momento e local específico para que tais conversas se deem de forma combinada e organizada.
E estratégico pois funcionará como uma rede de proteção tanto para a família, como para a empresa, de forma que assuntos da primeira não influenciem a tomada de decisões e rotina da segunda, e para que problemas ou questões operacionais do negócio não contaminem as relações familiares gerando desgastes e conflitos desnecessários.
Para exemplificar o âmbito de atuação e leque de temas que podem ser tratados por este Conselho, elencamos as seguintes atribuições:
- Cuidar dos interesses a longo prazo da família;
- Transmitir expectativas e planos do núcleo familiar ao Conselho de Administração ou ao Conselho Consultivo da empresa;
- Promover a comunicação, troca de informações e a integração dos familiares, evitando conflitos;
- Deliberar sobre assuntos inerentes à família e sua dinâmica de relações, como a sucessão e a continuidade da empresa sob o controle familiar;
- Decidir sobre o ingresso e a retirada de familiares do negócio, prevendo regras e critérios específicos;
- Criar planos de preparação e educação profissional de herdeiros (preparação de sucessores) e acompanhar o seu cumprimento e desenvolvimento;
- Criar regras objetivas e técnicas para o ingresso de herdeiros na empresa em papéis e funções de liderança;
- Elaborar políticas de investimento para a família, abarcando temas como a aquisição e venda de ativos, imóveis, decisões sobre partilha da herança e assuntos análogos que se relacionem diretamente ao patrimônio familiar.
Como é possível notar, e nas palavras de Sérgio Botrel, o Conselho de Família é o “verdadeiro interlocutor entre a família e a empresa”.
Ademais, seja no caso do Conselho ou da opção por uma estrutura mais simplificada, como a Assembleia Familiar, é importante que este órgão conte com uma regulamentação formalizada, ou seja, que tenha regras objetivas sobre o seu funcionamento. Falamos aqui da forma de convocação, periodicidade e local das reuniões, mesmo que tais regras não sejam (e nem necessitem ser) rígidas. Sugere-se, entretanto, que o Conselho de Família não tenha como base ou escritório, e nem utilize para reuniões e encontros, as dependências da empresa, justamente para materializar a devida segregação das esferas e assuntos familiar, de um lado, e empresarial, de outro.
Conclui-se, portanto, que o Conselho de Família se revela como mais um importante pilar de perpetuação do legado familiar, sendo indispensável às boas práticas de governança de empresas deste perfil, vez que proporciona um espaço adequado para o cuidado legítimo de assuntos familiares que, de outra forma, poderiam interferir indevidamente e até mesmo de forma negativa no âmbito empresarial.
Ao institucionalizar um órgão próprio para a comunicação entre os familiares, o Conselho de Família cria uma estrutura que permite organizar a interlocução com os órgãos de gestão da empresa, contribuindo para criar um sistema mais coeso, harmônico e eficiente, baseado na confiança e na transparência.
Dessa forma, preservam-se a harmonia entre os membros e os laços familiares, fortalecendo os três eixos da família empresária (família, gestão e propriedade) e criando um ecossistema sustentável que trabalhará para preservar e dar continuidade ao legado comum.
Maria Fernanda Penedo
É advogada no escritório Pádua Faria Advogados, graduada em Direito pela FACAMP e pós-graduada em Direito dos Contratos e Direito Societário pela FGV Direito SP (FGV LAW).
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