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STJ confirma que Fifa deve indenizar inventor do spray de barreira

Em todas as fases da contratação, o comportamento precisa estar de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade para concretização das legítimas expectativas das partes negociantes.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça manteve a condenação da Federação Internacional de Futebol (Fifa), entidade máxima da modalidade, ao pagamento de indenização para a empresa do inventor do spray de barreira, o brasileiro o brasileiro Heine Allemagne.

Segundo a decisão, a má-fé da Fifa foi constatada por uma série de atitudes da entidade: promessa de compra e negociação da patente; uso do dispositivo por anos sem qualquer contrapartida, incluindo obtenção da expertise; ocultação da marca durante a Copa do Mundo de 2014; e encerramento das negociações após criação da “legítima expectativa”.




Contexto

O spray consiste em uma espuma volátil, que desaparece em segundos, e é usado pelos árbitros de futebol para fazer marcações no campo — geralmente, para delimitar a posição da barreira nas faltas. O inventor do produto assessorou a Fifa a implantar o recurso nas partidas oficiais. O spray já foi usado em diversas competições, incluindo Copas do Mundo.

Mas o brasileiro nunca recebeu a devida compensação da entidade, que havia prometido adquirir a patente. Em 2017, a empresa da qual ele é proprietário acionou a Justiça contra a Fifa.

Em 2021, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro condenou a Fifa a indenizar o inventor devido ao uso não autorizado e sem contrapartida. A Fifa recorreu ao STJ e tentou reverter a condenação, mas ela foi mantida.


Fundamentação

O julgamento foi concluído no final de maio. Prevaeleceu o voto do ministro Humberto Martins, relator do caso.

“A aplicação do princípio da boa-fé objetiva em todas as fases da contratação, conforme leciona a doutrina e a jurisprudência, tem importante função social de estimular a conduta leal e cooperativa entre as partes negociantes, coibindo exercício abusivo de direitos pelas partes e protegendo as naturais expectativas criadas no desenvolvimento da relação contratual e confiança depositada no comportamento do outro”, apontou ele.

A Fifa tentou limitar os danos ao período após 2015, alegando prescrição do período anterior. Mas Martins manteve as conclusões do TJ-RJ em sentido contrário.

“O processo negocial em foco, sendo de grande monta e, por sua natureza, necessariamente perduraria por anos, protraindo-se no tempo, não podendo haver interpretação de forma restritiva ao desenvolvimento de práticas comerciais como a do caso concreto”, explicou.

O magistrado também entendeu que o dano foi continuado, ou seja, não seria possível delimitar o ano de 2015 para início do prazo de prescrição.

Embora tenha conseguido no mesmo STJ que os efeitos de eventual condenação ficassem limitados ao território brasileiro, a Fifa alegou agora, no Recurso Especial, que a Justiça brasileira não teria competência para julgar o caso — o que não foi aceito. Para Martins, o tema foi “exaustivamente debatido” e “devidamente decidido” pelo TJ-RJ.

Entre os ministros, houve divergência em apenas um ponto: sobre o cabimento de indenização pelo fato de a Fifa ter ocultado a marca do spray durante a Copa do Mundo de 2014. Mas a maioria do colegiado de ministros decidiu que este fato também é indenizável.

O único pedido da Fifa aceito pela 3ª Turma foi a fixação da taxa Selic para correção do valor da indenização que deverá pagar. A quantia ainda será calculada em processo de liquidação de sentença, a ser iniciado na Justiça estadual do RJ.

O inventor do spray de barreira foi representado no STJ pelo Teixeira, Quattrini & Silvio Rocha Escritórios Associados e pelo Navarro, Botelho, Nahon & Kloh Advogados.


Desdobramentos

Em outro processo, a Fifa chegou a tentar anular a patente da invenção do spray, registrada em 44 países. Segundo a entidade, o produto não poderia ser considerado uma invenção, pois não seria uma novidade, e não haveria descrição correta de sua composição.

No último mês de março, a Justiça Federal do Rio negou o pedido da Fifa e confirmou que o spray cumpriu todos os requisitos previstos na Lei da Propriedade Industrial.

Clique aqui para ler o voto do relatorREsp 2.078.517



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